terça-feira, 25 de julho de 2017

O gradual processo de liberalização do Labour



por István Mészáros

Marcar como época do grande recuo os anos que se seguiram à implosão soviética — datação preferida por muitos intelectuais que foram de esquerda como justificativa para o fato de terem tomado sua “estrada para Damasco” — leva a descrever erroneamente as conversões pessoais e, o que é mais importante, a minimizar os colapsos institucionais. Pois não foram apenas os partidos comunistas ocidentais que àquela época se transformaram em tímidos partidos socialdemocratas da ordem estabelecida, buscando no colapso soviético a justificativa de sua dramática mudança de rota. Ao mesmo tempo, também os velhos partidos socialdemocratas dos principais países da Europa ocidental se transformaram em partidos conservadores de centro direita, tornando-se indistinguíveis dos instrumentos políticos da “revolução thatcherista”.

As conversões pessoais foram, evidentemente, parte essencial — mas apenas parte — desse processo de desvio significativo do espectro político para a direita. Por isso, não é surpreendente ver todo o Partido Trabalhista Britânico se metamorfosear no partido do “novo trabalhismo” para conseguir manter, depois de sua vitória eleitoral, todas as leis antitrabalhistas de Margareth Thatcher, apesar dos compromissos manifestos em contrário, e torná-las de fato, sob certos aspectos, ainda mais autoritárias.

Esses ponderáveis desenvolvimentos históricos não podem ser explicados apenas pelas “conversões pessoais”. Ao contrário, por vezes, as surpreendentes conversões individuais só se tornam inteligíveis quando colocadas contra o pano de fundo da tendência geral dos acontecimentos históricos. Afinal, não se deve esquecer que as primeiras medidas drásticas do monetarismo neoliberal na Grã-Bretanha foram impostas pela maior autoridade econômica do “Velho Trabalhismo”, Denis Healey, sob o regime esquerdista de faz-de-conta do primeiro ministro Harold Wilson, bem antes de o Partido Conservador Britânico conseguir abraçar inteiramente a forte liderança de direita de Margareth Thatcher. É de se notar que a vitória eleitoral dela ocorreu depois de o sucessor de Harold Wilson no cargo de primeiro-ministro, James Callaghan, ter-se dirigido a uma plateia de operários com estas palavras brutalmente francas: “o partido acabou”. Deste modo, ele indicava a determinação do Partido Trabalhista de seguir um novo curso de liquidação progressiva dos ganhos da classe operária britânica no pós-guerra. Assim, o surgimento do malfadado consenso neoliberal precedeu a vitória eleitoral dos conservadores. O subsequente abandono explícito do princípio central da constituição do Partido Trabalhista — sua cláusula quarta, o compromisso programático do trabalhismo britânico com a garantia da propriedade comum dos meios de produção — foi apenas a conclusão lógica de um processo retrógrado que havia se iniciado muito tempo antes.

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MÉSZÁROS, I. O poder da ideologia. Trad. Magda Lopes e Paulo Cezar Castanheira. São Paulo: Boitempo, 2012, p. 14-15.
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